UM GRITO DE FELICIDADE
(Publicado no Jornal A Esperança)
No dia 5 de Dezembro de
2005, o Jornal Hoje (Globo) exibiu na TV as imagens de um impressionante e
comovente resgate ocorrido na rodovia Fernão Dias, em Minas Gerais. A pequena Júlia,
de seis meses de idade, foi salva com leves lesões das ferragens de um carro que
foi imprensado entre duas carretas. Pelo uso da cadeirinha. No acidente, os pais da criança, que
estavam nos bancos da frente, morreram na hora. O resgate dramático do bebê durou
duas horas. As imagens na época tocaram o jornalista Christiano Couceiro, que
tinha 29 anos. A cena que marcou e transformou sua vida: A criança sendo
erguida das ferragens pelos braços do bombeiro Davi que, entregando-a nas mãos
dos paramédicos, deu um grito de felicidade.
Na manhã do dia seguinte, Couceiro dirigia-se
para o trabalho. O balanço de sua trajetória até ali, indicava que ia tudo bem:
casara há pouco tempo com a farmacêutica Raissa Couceiro, a carreira de
jornalista consolidava-se, a vida financeira prosperava, amava a profissão e, enfim,
saboreava a colheita que plantara nos noves anos de atuação como jornalista.
Mas as imagens daquele salvamento - em especial a expressão do bombeiro Davi
não saíam da cabeça. Em Demian, Herman
Hesse escreveu que o acaso não existe. “Quando alguém encontra algo de que
verdadeiramente necessita, não é o acaso que tal proporciona, mas a própria
pessoa; seu próprio desejo e sua própria necessidade o conduzem a isso.” Durante
aquele percurso, Couceiro leu uma faixa que anunciava: “Concurso Corpo de
Bombeiros”. Naquele momento ele tomou a decisão que mudaria completamente a sua
trajetória: iria tornar-se um Bombeiro.
Resgate de Julia está disponível em vídeo no Youtube |
Naquele ano, 2005, já eram oito anos trabalhando em televisão. Formado em Jornalismo pela UFRN, em 2001, Couceiro iniciou a carreira quando ainda era estudante de jornalismo, na TV Potengi, afiliada a Rede Bandeirantes. Iniciou na área de Esportes, mas não se identificava com o futebol - a preferência dos programas do tipo. “Gosto de esportes alternativos, aqueles mais amadores. Os programas esportivos privilegiam o futebol e não destacam atletas de outras modalidades. Mas foi uma porta que se abriu e eu me agarrei a ela”, disse o Tenente Couceiro que gosta de corridas de rua e é faixa-preta em jiu-jitsu. Tempos depois, em 1998, o chamaram para fazer uma transmissão ao vivo do “De Olho na Folia” – ele entraria no ar fazendo a cobertura do Carnatal. Os diretores gostaram da espontaneidade do estudante e da forma descontraída com que abordava pessoas e entretinha o telespectador. Outros programas foram aparecendo, com conteúdos variados: desde a cobertura de rallys à agropecuária: Couceiro fez reportagens para Os programas “Garagem”; Arrastapé; Viva Verão; Trilha do Sol, Agro Potengi - esse último deixou saudade: “Eu adorava fazer o Agro Potengi. Como um bom jornalista, eu não gosto de rotina. A gente tinha sempre uma história diferente para contar e nada melhor do que viajar pelo interior do RN, conhecendo criações de diferentes tipos de animais, plantações, processos de criação, de produção, o comércio. Lembro da turma do Seridó, que criava bode de uma forma muito curiosa. Aquilo não fazia parte do meu dia a dia e eu me entregava, de fato, para aquelas situações”, disse o tenente de 36 anos.
Mas o que mais marcou sua imagem na televisão
foram, de fato, as coberturas dos Carnatais. Por anos, a TV Potengi era a única
emissora que fazia essa transmissão e a grande audiência deu a Couceiro uma
grande projeção. Mas ele não queria
ficar apenas na área do Entretenimento e resolveu seguir outras linhas
editoriais: atuou no Acontece Natal e fez reportagens para o programa Linha
Dura, que na época era apresentado pelo hoje vereador Luiz Almir. O Linha Dura
era um programa jornalístico, exibido ao meio dia que cobria desde problemas da
cidade a temas como o Esporte. Luiz Almir relembra a época que trabalhou com
Couceiro: “Muito competente em tudo o que faz. Ele sempre deu conta do recado. Para
ele não havia tempo ruim e nunca foi preguiçoso. Tenho muito apego, estima. O
pouco que sei hoje, passei para ele. Se há alguma coisa sobre os bombeiros nos
meus programas, eu chamo ele para participar.”
“Algo muito
forte me chamou.” Antes da mudança radical, a carreira de Couceiro estava em
ascensão e ele fazia o que gostava: dirigia o Jornal da Câmara Municipal de
Guamaré, um impresso mensal de seis páginas criado por ele; era jornalista na
TV Potengi e diretor de Comunicação Social da Ceasa. Devido à projeção que a
televisão proporcionava, também fazia campanhas publicitárias para a loja Miami
Imports. Após ver a reportagem na tevê e decidir ser bombeiro, Couceiro
afastou-se dos meios de comunicação para se preparar para o concurso. “Resolvi
fazer uma reviravolta na minha vida, mesmo passando a ganhar menos,
financeiramente. Foi a partir daquele vídeo do resgate que eu acreditei. Mesmo
sem estar a muito tempo sem estudar, faltando poucos meses para a prova do
concurso, algo muito forte me chamou: ‘Vamos ser bombeiro’. Com a aprovação, fui
morar no Pará, para cursar os três anos da Escola de Formação de Oficiais (no
RN não há academia e todos os bombeiros da região são formados em outros
estados)”. A esposa Raissa se mudou para o Pará um ano depois, em 2007.
Ao fim do curso, Christiano Couceiro conquistou a
1ª colocação geral, numa disputa com 56 cadetes de quatro estados, alcançando a
pontuação média de 9.65, número histórico nos 17 anos de existência da Escola
de Formação de Oficiais no PA. “Foi um resultado que me trouxe muita alegria. O
que me fez lutar por ele foi o sentimento daquele salvamento que eu vi na
televisão e que me motivava diariamente. Havia dificuldades na vida militar,
mas eu não enxergava porque estava motivado. Era a vontade de ser e fazer o
mesmo que aquele bombeiro fez. Conseguir salvar alguém. Então os três anos no
Pará foram muito bons. Sofridos, mas bons de lembrar depois que passam”.
“Agora,
você está realmente um bombeiro”
O coração bateu forte quando entrou na viatura de
combate a incêndio pela primeira vez como bombeiro formado, ao retornar a
Natal. “Ouvi a sirene tocar e pensei: ‘E agora?’ A cada dia, um bombeiro fica
como chefe da guarnição e naquele dia eu chefiava a operação. Naquela
ocorrência, enquanto eu me deslocava, ao meu lado não tinha mais instrutor, não
tinha mais professor, não tinha mais ninguém para me orientar, naquele momento
era eu que deveria ir na guarnição, então aí você sente o tamanho da sua
responsabilidade, agora você está realmente um bombeiro”.
Atualmente, o Tenente Christiano Wanderley Couceiro
Costa exerce a função de assessor de comunicação do Corpo de Bombeiros do RN
promovendo junto a população ações como a “Campanha Praia Segura, “Campanha São
João Seguro”, “Caminhada da Mãe Potiguar”. “Qualquer campanha de publicidade ou
de divulgação, que a população confia no que eu estou falando, faço questão de
estar dentro acompanhando, para ver o resultado, pois é preciso dar um retorno
para quem está ajudando. Não é só uma assessoria de divulgar uma informação. É
também abraçar as consequências que essa comunicação gera dentro da instituição.”
A 19ª Corrida Soldados do Fogo foi um evento
realizado pelo Corpo de Bombeiros Militar do RN, na tarde do último dia 20 de
Julho. Foram 1.300 atletas inscritos e um grande público esteve presente em
frente a sede da corporação, em Natal. O Tenente Christiano Couceiro estava
presente, apresentando o evento, de óculos escuros e microfone em mãos, andando
por todos os lugares, subindo e descendo do palco montando na área lateral à
sede da instituição, resolvendo os problemas que surgiam de última hora e divertindo
o público formado por pessoas de todas as faixas etárias, que correspondia,
animado: “Esse é aquele cara da televisão”, comentavam alguns. Christiano
Couceiro estava muito a vontade e parecia ser incansável.
O Tenente na Corrida Soldados Do Fogo |
“Houve um incêndio em uma casa no bairro
Satélite. Tiramos um senhor vivo de dentro da geladeira. Foi o único local que
ele encontrou para se salvar, para não respirar a fumaça. Ele se salvou porque
se jogou dentro de uma geladeira. E esposa dele, infelizmente, apesar das
manobras para ressussitá-la, não sobreviveu, porém conseguimos fazer com que os
órgãos vitais dela permanecessem ativos para que ela pudesse salvar outras
vidas com a doação de órgãos. Foi uma ocorrência marcante.”
Assessoria de Comunicação do Corpo de
Bombeiros
“Foi um desejo articulado. Eu quando voltei a
Natal, comecei a fazer algumas divulgações por conta própria. Utilizava o
espaço da corporação para divulgar ações, tirava fotos, ajudava a atualizar o
site. Até que, em 2009, o comandante da época, o coronel Cláudio Christian da
Silva, começou a me considerar já o assessor de comunicação. Mas na nova
gestão, a do coronel Elizeu Dantas, foi dado um corpo melhor a essa assessoria,
com melhor estrutura e compra de equipamentos. Foi designado que eu saísse do serviço
operacional para que tivesse uma dedicação integral na comunicação oficial da
instituição.”
Tenente Christiano Couceiro e o Capitão Elizeu Dantas |
A Televisão
“Até hoje tem gente que o para na rua para
perguntar se eu voltarei à televisão. Em algumas entrevistas que o Comandante Geral
concede, a própria imprensa pede para que ele me autorize, só que o regulamento
não permite. Recebo até hoje convite por escrito da direção da TV Bandeirantes
para voltar. Nos três anos que eu estava no Pará, os convites vinham do estado
de São Paulo, da Band SP, perguntando se poderia fazer uma articulação com o
governo, no caso, solicitar à governadora. Eram coisas que me deixavam: “Caramba!
Será que é isso tudo mesmo? O pessoal queria mesmo? Porque
é tão fácil você substituir alguém hoje. Há um respeito por mim e acredito que tenha
sido em função de eu tratar as coisas, sempre com muita emoção. O jornalista
tem que ter uma linguagem fácil, tem que ter afinidade e sinceridade com o
público. Sei que eu não agradava a todos e ouvia as críticas. Aliás, as principais
críticas vinham de casa.”
Sonhos
“No plano pessoal, sonho ter filhos. Em breve,
voltarei à vida que tinha em 2006, tendo a minha casa própria, sair do aluguel.
No momento eu e minha esposa vivemos na casa de familiares, aguardando a
entrega do nosso apartamento. Como todo profissional que quer crescer, meu
objetivo é chegar a ser o Comandante Geral do Corpo de Bombeiros. Para mim,
pode ser uma coisa que dure 25 anos, ou pode ser que eu nunca chegue lá, porque
é mais do que você trabalhar e se mostrar um bom profissional: depende de uma
indicação do governador ou governadora do estado, da época. Então, se eu
merecer ou tiver capacidade pra isso que eu possa ser um dia.”
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